quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Por Outra Globalização

MILTON SANTOS-notável sábio ou profeta social brasileiro. Em  “POR OUTRA GLOBALIZAÇÃO” (lançada em 2000) seu conceito de “utopia” parece alinhar-se em múltiplos aspectos com a crise mundial emergente . Vejamos algumas gotas de seu pensamento:

“... A gestação do novo, na história, dá-se frequentemente, de modo quase imperceptível para os contemporâneos, já que suas sementes começam a se impor quando ainda o velho é quantitativamente dominante. É exatamente por isso que a “qualidade” do novo pode passar despercebida... A história se caracteriza como uma sucessão ininterrupta de épocas. Essa idéia de movimento e mudança é inerente à evolução da humanidade. É dessa forma que os períodos nascem, amadurecem e morrem...”

... Uma outra globalização supõe uma mudança radical das condições atuais, de modo que a centralidade de todas as ações seja localizada no homem: a precedência do homem. Sem dúvida, essa desejada mudança apenas ocorrerá no fim do processo, durante o qual o reajustamentos sucessivos se imporão. Nas presentes circunstâncias a centralidade é ocupada pelo dinheiro, em suas formas mais agressivas, um dinheiro em estado puro sustentado por uma informação ideológica, com a qual encontram simbiose...

...A primazia do homem supõe que ele estará colocado no centro das preocupações do mundo... Dessa forma, estarão assegurados o império da compaixão nas relações interpessoais e o estímulo a solidariedade social, a ser exercida pelos indivíduos, entre o indivíduo e a sociedade e vice-versa e entre a sociedade e o Estado, reduzindo as fraturas sociais, impondo uma nova ética, e, destarte, assentando bases sólidas para uma nova sociedade, uma nova economia, um novo espaço geográfico.

A nova paisagem social resultaria do abandono e da superação do modelo atual e sua substituição por um outro, capaz de garantir para o maior número a satisfação das necessidades essenciais a uma vida humana digna, relegando a uma posição secundária necessidades fabricadas, impostas por meio da publicidade e do consumo conspícuo.

Assim o interesse social suplantaria a atual precedência do interesse econômico e tanto levaria a uma nova agenda de investimentos como a uma nova hierarquia nos gastos públicos, empresariais e privados.

...Abolida a regra da competitividade como padrão essencial de relacionamento, a vontade de ser potência não seria mais um norte para o comportamento dos estados, e a idéia de mercado interno será uma preocupação central.

...A busca de um futuro diferente tem de passar pelo abandono das lógicas infernais que, dentro dessa racionalidade viciada, fundamentam e presidem as atuais práticas econômicas e políticas hegemônicas.

A atual subordinação ao modo econômico único tem conduzido a que se dê prioridade às exportações e importações, uma das formas com as quais se materializa o chamado mercado global. Isso, todavia, tem trazido como conseqüência para todos os países uma baixa qualidade de vida para a maioria da população e a ampliação do número de pobres em todos os continentes, pois, com a globalização atual, deixaram-se de lado políticas sociais que amparavam, em passado recente, os menos favorecidos, sob o argumento de que os recursos sociais e os dinheiros públicos devem ser primeiramente utilizados para facilitar a incorporação dos países na onda globalitária. Mas, se a preocupação central é o homem, tal modelo não terá mais razão de ser.

... Mais cedo ou mais tarde, as condições internas a cada país, provocadas em boa parte pelas suas relações externas, levarão a uma revisão dos pactos que atualmente conformam a globalização. Haverá, então, uma vontade de distanciamento e posteriormente de desengajamento, conforme sugerido por Samir Amin, rompendo-se, desse modo, a unidade da obediência hoje predominante.

...Uma coisa parece certa: as mudanças a serem introduzidas, no sentido de alcançarmos uma outra globalização, não virão do centro do sistema, como em outras fases de ruptura na marcha do capitalismo. As mudanças sairão dos países subdesenvolvidos.

...”Até mesmo a partir da noção do que é ser um consumidor, poderemos alcançar a idéia de homem integral e de cidadão. Essa revalorização radical do indivíduo contribuirá para a renovação qualitativa da espécie humana, servindo de alicerce a uma nova civilização.

A reconstrução vertical do mundo, tal como a atual globalização perversa está realizando, pretende impor a todos os países normas comuns de existência e, se possível, ao mesmo tempo e rapidamente. Mas isto não é definitivo. A evolução que estamos entrevendo terá sua aceleração em momentos diferentes e em países diferentes, e será permitida pelo amadurecimento da crise.

Esse mundo novo anunciado não será uma construção de cima para baixo, como a que estamos assistindo e deplorando, mas uma edificação cuja trajetória vai se dar de baixo para cima...

...”Ao contrário do que tanto se disse, a história não acabou: ela apenas começa...”

Um comentário:

  1. "A nova paisagem social resultaria do abandono e da superação do modelo atual e sua substituição por um outro,"

    Sim. O desenvolvimento pela ciência da riqueza em um tempo ideal e prático, pelo modelo das forças produtivas, a priori, não é riqueza a partir dos bancos que passam a aniquilar o Estado.

    “... A gestação do novo, na história, dá-se frequentemente, de modo quase imperceptível para os contemporâneos, já que suas sementes começam a se impor quando ainda o velho é quantitativamente dominante. É exatamente por isso que a “qualidade” do novo pode passar despercebida..

    Há que se criar a história de gestação dos períodos do novo, e, claro, o novo não pode ser a partir da base antiga; mas considerado de forma elaborado e limitado no espaço de tempo quantitativo, ao ponto que fica determinado a qualidade de valor da moeda, como construção que se pode unir o desenvolvimento máximo das forças produtivas.

    "Essa revalorização radical do indivíduo contribuirá para a renovação qualitativa da espécie humana, servindo de alicerce a uma nova civilização."

    Exemplo; A expansão da moeda é determinada e integrada como uma antítese legítima do valor do trabalho e da produção,(in)forma de consciência do movimento futuro.

    "Esse mundo novo anunciado não será uma construção de cima para baixo, como a que estamos assistindo e deplorando, mas uma edificação cuja trajetória vai se dar de baixo para cima."

    Esse mundo novo será o modelo da história do mundo real.

    ...”Ao contrário do que tanto se disse, a história não acabou: ela apenas começa...”

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